O Bispo e o Código Penal
Em um excelente conto, "Press Conference", publicado há três décadas, Alberto Dines descreve a volta de Cristo, e a entrevista coletiva que concede aos grandes meios de comunicação do mundo. Se Dines reescrevesse hoje o conto, naturalmente faria um dos entrevistadores perguntar ao Messias o que ele pensa do bispo Edir Macedo e de sua prática, opulenta e rendosa igreja. Macedo, com suas sacolinhas e seus templos majestosos, faz lembrar o Vaticano na passagem do século XV para o século XVI, quando três papas sucessivos apodreceram tanto a Igreja que dessa podridão surgiram Lutero e a Reforma: Rodrigo Bórgia, eleito pontífice com o nome de Alexandre VI, em 1492; Giulio della Rovere (Julio II), que o sucedeu em 1503; e Giacomo Médici (Leão X), que reinou até 1521, e morreu meses depois de excomungar Lutero.
Foram eles que, associados aos banqueiros Fugger, encarregados da arrecadação e aplicações, criaram um sistema mundial de extorsão dos fiéis, condenando ao inferno os que não contribuíssem com suas espórtulas e oferecendo aos generosos os melhores lugares ao lado de Cristo, no céu.
Ao contrário desses papas, que tomavam dinheiro dos crentes, oferecendo-lhes o céu, Macedo é muito mais prático: toma-lhes dinheiro, oferecendo os êxitos no mundo. Os fiéis entregam o dinheiro confiando em um Cristo que nunca existiu: o Cristo que vende, a dinheiro vivo, prosperidade, fama, amores, êxito nos negócios. Não se trata do Cristo que dizia, a quem o quisesse seguir, que distribuísse os seus bens com os pobres. O Cristo de Macedo manda os pobres tirar do que lhes falta, do almoço aos remédios e ao agasalho, para oferecer a um bando de pastores recrutados entre os “obreiros” mais eficientes na arrecadação de dízimos e doações extras.
Faria bem a reedição do vídeo em que os pastores da Igreja Universal festejam a estréia de seus bispos nos Estados Unidos, quando a primeira nota de cem dólares é exibida com regozijo por um deles. Edir Macedo hoje rivaliza com o Reverendo Moon em matéria de exploração da credulidade pública no mundo.
A ditadura e os governos que a sucederam foram muito lenientes com o bispo e os seus auxiliares. Usaram-nos para narcotizar os pobres e mantê-los na ilusão de que Cristo lhes daria uma vida próspera, enquanto as elites, espertas, se locupletavam no atacado, deixando ao bispo a exploração no varejo.
Temos que ter coragem para cortar o passo dessa nova e terrível forma de fascismo religioso que começa a crescer. A Polícia Federal volta a examinar as atividades da Igreja Universal. Não pode deixar a tarefa no meio do caminho. Afinal, com todos os seus defeitos e as exceções constrangedoras, a corporação policial é uma das poucas esperanças do nosso povo.
É bom não esquecer que o PFL foi o primeiro partido político a abrir suas portas para o bispo. Não é por acaso que a ele pertença o deputado detido com a mão nas malas. A vitória de Fernando Henrique sobre Lula, em 1994, foi decidida pelo bispo, em culto com a presença de centenas de milhares de pessoas no Rio de Janeiro. E, há menos tempo, ficou claro que o bispo tem ambições bem maiores. Quer constituir um partido político e disputar as eleições presidenciais. Nada é mais tirânico e corruptor do que a ligação entre o dinheiro, o poder político e a religião.
As atividades ilícitas do bispo Macedo teriam sido reprimidas desde o início, com a aplicação do Código Penal, que punia o abuso da credulidade pública. Mas o dispositivo, que datava de 1941, foi revogado em 1997, durante o governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso. Sem comentários.
MAURO SANTAYANA 13/7/2005
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