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René Queiroz

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sexta-feira, maio 02, 2008

Júri midiático e o processo civilizatório

Doloroso e custoso, o processo civilizatório – também ininterrupto, para que se lhe possa atribuir alguma humanidade. Nem por isso a sanha e o gosto de sangue deixam de assaltar os espíritos, principalmente em momentos de comoção social, como o suscitado pelo caso Isabella Nardoni.

Não cabe aqui o julgamento dos (ainda) averiguados Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, pai e madrasta da menina, respectivamente – pois essa tarefa é da justiça, de acordo com os trâmites legais a que todos têm direito numa sociedade minimamente civilizada, ainda que o horror e a superexposição dos fatos açulem os ânimos daqueles que, à maneira de Talião, esperam a punição rápida dos possíveis autores de tal atrocidade.

Importa dizer que a arena (igualmente suja de sangue?) em que agora se desenrolam os eventos parece ser a midiática – palco da espetacularização, até mesmo da morte, comercializada em tintas sensacionalistas, num surto quase esquizofrênico dos noticiários, típico também da lógica capitalista, no esgotamento dos fatos "consumíveis" como um produto qualquer.
Não é por acaso que o casal Nardoni refutou as acusações, culpabilizando a mídia pelo prejulgamento – entretanto, utilizando-se do próprio jogo midiático com a entrevista concedida (sabe-se lá por quais razões) ao Fantástico numa tentativa, talvez, de demarcar limites no território da opinião pública, ou angariar pontos para uma absolvição no "júri midiático".

É em situações como estas que costumam aflorar os preconceitos, a intolerância, os medos sociais e todo ranço que permeia a sociedade – de certo modo a mídia os reflete, quando também deveria refletir sobre as inter-relações dos fenômenos sociais, ainda que suscitados por tragédias ou crimes hediondos.

Decerto que os meios de comunicação não têm obrigação de educar o público, tampouco devem deseducá-lo, eximindo-se de qualquer responsabilidade na abordagem das notícias ou na formação de opinião. Antes deveriam estar atentos, senão às próprias falhas e excessos, aos do judiciário e da sociedade em geral – talvez seja esta a maior contribuição possível para o aperfeiçoamento do que podemos ainda chamar de processo civilizatório.

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