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quarta-feira, julho 09, 2008

A morte do emprego

Publicado em O Jornal da Tarde,15/09/1994
Não se assuste. Eu disse a morte do emprego e não a morte do trabalho. Além do mais, isso só vai acontecer no Brasil daqui há uns 15 ou 20 anos.
O último número da Revista Fortune (19/09/94) faz um resumo dos mais recentes estudos na área trabalhista para anunciar uma estrondosa revolução para o início do próximo milênio - tempo em que os empregos completarão o seu desaparecimento.
O quê os seres humanos vão fazer? Como ganharão a vida? Os referidos estudos mostram que o atual conceito de "emprego" refere-se a uma posição fixa, na qual a pessoa exerce uma atividade específica, de forma contínua, numa mesma empresa. é isso que vai acabar. O trabalho do futuro não terá nada de fixo, específico, contínuo ou concentrado numa empresa.
Ao contrário. Com o avanço acelerado das novas tecnologias e com a individualização das demandas, as grandes empresas, com raras exceções, serão forçadas a atomizar sua
produção, subcontratando atividades para pequenas empresas e para profissionais autônomos. Nesse novo mundo, o trabalho será dispersado. Os trabalhadores deixarão de ser os "donos dos empregos". Eles vão se transformar em provedores de serviços, engajados em projetos que terão começo, meio e fim. Nesses projetos, os seus colaboradores serão demandados a executar várias tarefas, à distância ou em locais diferentes e sempre com muita criatividade e periodicidade variável.
Isso atingirá também os chefes. Aliás, a chefia é uma categoria que já entrou num acelerado processo de extinção. No mundo da flexibilização do trabalho não haverá lugar para grandes hierarquias. Os trabalhadores multifuncionais vão se reportar uns aos outros. As informações serão amplamente disseminadas. Todos os que trabalham em determinado projeto conhecerão as virtudes e os limites das empresas, das tecnologias e dos seu companheiros.
O emprego vai morrer para a maioria dos trabalhadores. Estes trabalharão por contratos, em projetos finitos, junto a os mais variados grupos que demandarem seu talento. Terminado um projeto, eles passarão para outro, no mesmo ambiente ou em ambiente diferente. Alguns serão mais móveis; outros usarão intensamente a fibra ótica e outras formas de transmissão de idéias e comandos. Será o mundo do tele-trabalho. Todos serão mais donos do seu tempo.
E como ficarão as licenças, férias e aposentadoria? Já nas primeiras décadas do próximo milênio, tudo isso vai virar peça de museu porque, no novo mundo do trabalho, desaparecerá a relação de subordinação entre empregadores e empregados. Isso ocorrendo, desaparecerá quem concede licenças, férias e aposentadoria.
Os trabalhadores - sendo cada vez mais donos de si mesmos - saberão como assegurar seu futuro e quanto tempo usar para descanso, lazer, saúde, etc. Ah! Será um grande teste para o atual preceito constitucional que assegura a todos os empregados registrados um período de 40 dias de férias por ano (30 em tempo e 10 em dinheiro). Vamos ver se eles quererão se autoconceder esse mesmo período nas novas condições de trabalho...
A Revista Fortune alerta as empresas que ainda não pensaram nesse novo mundo que
comecem a pensar, respondendo às seguintes perguntas:
(1) O trabalho atual está sendo feito pelas pessoas certas?
(2) Tudo o que é feito dentro da empresa precisa continuar a ser feito nesse ambiente?
(3) O atual modo de organizar os empregados é o mais eficiente?
(4) A remuneração do trabalho está estimulando a criatividade e a produtividade dos empregados?
Essas mesmas perguntas valem também para os empregados. Afinal, o que vai morrer é o
emprego e não o trabalho. O mundo terá uma imensa quantidade de trabalho a ser feito - mas, de modo diferente. Ela será feita com muito mais liberdade e com base na multifuncionalidade.
No Brasil, a morte do emprego vai demorar. Mas a preparação das novas gerações de
trabalhadores tem de começar já. No novo mundo do futuro só haverá lugar para quem for educado. Os demais serão párias. O trabalhador desqualificado valerá cada vez menos. E não haverá lei, constituição, partido ou sindicato que venha a ter força para reverter essa tendência.
O emprego vai morrer mas, o trabalhador não pode morrer junto com ele. Por isso, mãos à obra! Eduquemos a nossa gente...

José Pastore é sociólogo, especialista em relações do trabalho e desenvolvimento institucional,professor (aposentado) da Faculdade de Economia e Administração e pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, ambas da Universidade de São Paulo. É membro efetivo da Academia Paulista de Letras.

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