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René Queiroz

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quarta-feira, maio 02, 2007

Hegel e Marx....

Escreve-se frequentemente: “Hegel defendia a transformação apenas ao nível do Pensamento , enquanto Marx …” Isso não é rigoroso. A verdade é que, para Hegel, o motor da transformação é a Razão num processo dialéctico que caminha para a Ideia Absoluta, em que se realiza a plena identidade do sujeito com o objecto. Em vez de o sujeito ter o objecto como algo fora de si, exterior a si, alheio a si, agora, reconhece o objecto como idêntico consigo mesmo. A Ideia Absoluta é, pois, a verdade absoluta, e a necessidade de a atingir, o motor da história. Eu diria que a Ideia Absoluta é uma verdade absoluta que a história persegue sem nunca a atingir
Aliás, só se pode compreender a dialéctica hegeliana em ligação com a revolução e a destruição do mundo feudal, e isso não se passou no “Pensamento”. O seu papel foi traduzir filosoficamente o movimento revolucionário da época. Ela é revolucionária também quanto à forma:a) Separação dos dados imediatos, ruptura radical com o que existe, novo começo.b) Princípio da oposição e da negação.c) Princípio da mudança e do desenvolvimento incessantes - o “salto qualitativo”.
Toda a ideia tem três momentos: primeiro apresenta-se (a tese); opõe-se a si mesma (a antítese); e, finalmente, regressa a si mesma conciliando tese e antítese (a síntese).
Portanto, em ambos, Hegel e Marx, a transformação ocorre na prática. A diferença é que motor dessa transformação é, em Hegel a Ideia, a Razão, e em Marx são as forças produtivas e as relações de produção, i.e., a forma como o Homem e as forças produtivas se relacionam entre si no processo produtivo.
Para Hegel, sendo a História um aperfeiçoamento do Espírito, é necessariamente um crescimento de liberdade. Os factos da História comprovam isto. Nas primeiras civilizações, apenas um era livre (o Faraó, por exemplo) e os demais, escravos. Depois, vieram civilizações como a grega, a romana, em que alguns eram livres (as oligarquias privilegiadas, as aristocracias) e os demais, escravos. Finalmente chegaremos a um estado na História em que ninguém será escravo e todo serão realmente livres.
Todavia para Hegel, ao contrário de Marx, é a Razão quem dirige a História. Existe uma "astúcia da Razão", que utiliza os homens da História universal, imbuídos que são, regra geral, da sede do poder, da glória, da ambição, para através destes objectivos “egoístas” trazerem para a humanidade uma liberdade maior, um estado superior de civilização.
Em Marx, e cito o prefácio à “Zur Kritik der Politischen Ökonomie”: “Na produção social da sua existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a um grau de desenvolvimento determinado das suas forças produtivas materiais. O conjunto dessas relações de produção constitui a estrutura económica da sociedade, a base concreta sobre a qual se alicerça uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas de consciência social determinadas. O modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e intelectual em geral. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é, inversamente, o seu ser social que determina a sua consciência”.
Sobre o que se designou depois por Materialismo Histórico, Marx pouco mais adiantou. Todavia, entre os seus epígonos, os conceitos de «relações de produção» e de «forças produtivas» são, com muita frequência, utilizados sem que necessariamente se saiba aquilo de que se abstraiu na formação de tais conceitos. Quando os epígonos de Marx falam das relações recíprocas entre «relações de produção» e «forças produtivas», geralmente menosprezam o número infinito de fenómenos concretos, de homens, de coisas e de acções pelos quais essas relações, expressas de maneira abstracta, surgem concretamente na realidade.
Engels teria consciência disso, pois numa carta a Borgius, em 1894, frisou que, e eu cito isto frequentemente, por julgar que se trata de um passo importante de um dos fundadores do marxismo, “o desenvolvimento político, jurídico, filosófico, religioso, literário, artístico, etc., assenta no desenvolvimento económico. Mas reagem todos, uns sobre os outros, e sobre a base económica. Mas isto não porque a situação económica seja a única causa activa, e tudo o resto não passe de acção passiva. Pelo contrário, há uma acção recíproca”.
Isto é, Marx, na sua luta contra o idealismo hegeliano, levou a que os seus epígonos transformassem a teoria numa simplificação mecânica e unilateral do desenvolvimento histórico na medida em que só destacam as grandes transformações qualitativas do sistema social mas não tem em devida conta os processos complexos e prolongados que as preparam, nomeadamente o desenvolvimento concreto dos interesses e da estrutura social, subestimando a liberdade da acção individual e ignorando as motivações da ação subjectiva.
Em Hegel havia idealismo, mas havia dialéctica; no Marxismo soviético o idealismo foi substituído pelo mecanicismo e a dialéctica por um escolasticismo axiomático.
É essa a razão de “os regime marxistas terem falhado miseravelmente” ... de Marx só tinham os chavões.

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