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René Queiroz

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sábado, maio 06, 2006

O gás é dos trabalhadores

A decisão de Evo Morales, recém-eleito presidente da Bolívia, de nacionalizar o gás e o petróleo em território boliviano tem que ser compreendida como um marco histórico na história recente do país, que poderá ajudar em seu processo de industrialização e desenvolvimento social. Também é um gesto de afirmação soberana que vai melhorar muito a auto-estima dos bolivianos.
Desta vez, porém, o Brasil parece sair perdendo, porque a Petrobrás tem ativos no país. Políticos e, principalmente, setores da imprensa, exigiram reação truculenta do governo brasileiro.
Trata-se de uma medida naturalmente polêmica, ainda a ser digerida e devidamente entendida por todos, mas desde já é bom rechaçar a tentativa de setores reacionários da sociedade brasileira, entre os quais incluo a Globo, de usar o fato para produzir atrito entre duas nações que estão imersas na mesma busca pela maior união da América do Sul.
Autoridades dos dois países já garantiram que o fornecimento de gás não será interrompido e qualquer eventual aumento de preço será gradual e racional. De qualquer forma, a Petrobrás está atuando no sentido de aumentar a produção de gás na bacia de Campos.A "inteligentzia" reacionária nacional, da qual Arnaldo Jabor é um dos representantes preferidos, está usando o fato para atacar o governo Lula e todo o Mercosul.
Como sempre, falta visão. Falta franqueza e bom senso. É interessante para o Brasil que a Bolívia se desenvolva. Após o fim da II Guerra, os EUA iniciaram o plano Marshall, emprestando a fundo perdido bilhões de dólares para a Europa se reconstruir. Os EUA entendiam que precisavam de uma Europa forte e rica como mercado comprador para seus produtos.
É assim que compreendo a necessidade do Brasil ajudar seus parceiros latinos. Enquanto Jabor usou seu espaço na Globo para rogar praga para os bolivianos, prevendo mais pobreza e mais catástrofe, eu quero afirmar aqui que acredito no povo boliviano e, dentro das minhas possibilidade, estou disposto a ajudá-lo. É um país vizinho e espero haver um dia que os bolivianos venham ao Brasil como turistas e não como mão-de-obra barata.
Olhando-se do lado estritamente financeiro, uma Bolívia mais desenvolvida irá trazer benefícios enormes ao Brasil, porque será um grande mercado comprador de produtos brasileiros.
Do lado humano, político e cultural, uma Bolívia com mais auto-estima também será de grande valia para o Brasil, porque poderá contribuir com mais filmes, mais livros, mais músicas e produção científica.
Esse súbito nacionalismo de setores reacionários do Brasil é ridículo, hipócrita, oportunista.
O interesse dos trabalhadores é o mesmo em todo mundo, não importa a cor de sua bandeira: justiça social.
O que é bom para trabalhadores da Bolívia será bom para os trabalhadores do Brasil.
Viva a Bolívia, viva o Brasil!
Escrito por Miguel do Rosário

quinta-feira, maio 04, 2006

Até Clóvis Rossi, da Folha, quem diria...

O fracasso (da memória)
- Se eu lesse os jornais distraidamente, acabaria acreditando que toda a culpa pela nacionalização do gás boliviano é do presidente Lula e de sua política externa. Tudo bem, cada um acredita no duende de sua preferência, mas, para os que preferem fatos, um modesto ajuda-memória:
1 - A Petrobras se lançou ao gás boliviano no governo Fernando Henrique Cardoso, não no governo Lula. Logo, se culpa há (e, nesse caso, acho que não há), é do governo anterior.
2 - Digamos que, após a vitória de Evo Morales, na esteira de uma campanha em que prometeu nacionalizar os recursos naturais, a Petrobras e o governo deveriam ter ficado espertos. Tudo bem, mas o que fazer? Fechar as torneirinhas, botar o gás no bolso e voltar para casa? Ou mandar as tropas brasileiras se anteciparem e ocupar as refinarias antes que as bolivianas o fizessem?
3 - Da mesma forma, achar que Lula alinhou-se demais com Evo e, antes, com o venezuelano Hugo Chávez é acreditar em duendes. O grande esforço da diplomacia brasileira foi na construção do que agora se chama Comunidade Sul-Americana das Nações (desde FHC, aliás, e até antes, com Sarney e depois Itamar).
Incluía Chávez, claro, mas incluía também Carlos Mesa, o antecessor de Evo, e Alejandro Toledo, o agora inimigo de Chávez. Note-se que o melhor gesto do governo Lula para com a Venezuela foi ajudar na criação do grupo de amigos daquele país, ao lado dos Estados Unidos da América, entre outros.
Foi logo no início do governo e ajudou a evitar uma guerra civil.
Se Chávez se diz amigo de Lula, um certo George Walker Bush também se diz.
Bush invadiu o Iraque. Culpa do seu amigo Lula?
4 - O governo FHC deu apoio ao fracassado processo re-reeleitoral de Alberto Fujimori, personagem e processo muito mais deletérios para a democracia do que todas as bobagens e bravatas de Chávez.
E ninguém falou nada.

terça-feira, maio 02, 2006

Um presidente de palavra !

Evo Morales é um presidente de palavra: fez o que disse que ia fazer. E mais: fez o que tinha de fazer e o que devia fazer. Não está apenas nacionalizando (estatizando) o petróleo: está reconstruindo a auto-estima coletiva dos bolivianos. Evo Morales não merece críticas nem ataques. Está entrando para a história como um presidente que honra as promessas que fez. E dá uma certa náusea ouvir o vozerio na mídia dos que pedem medidas drásticas contra o governo (e o povo) da Bolívia, a grita para que o governo brasileiro aja “com frieza empresarial”, para que defenda “os interesses nacionais”. São as mesmas vozes que clamaram pela privatização de tudo neste país, inclusive da Petrobrás. As mesmas que exigem uma integração subalterna à pauta da globalização conservadora, ao império dos mercados dominados por interesses norte-americanos e europeus. Quer dizer: contra índio pobre a gente tem mesmo é que endurecer. Agora, quando se trata dos ricos do andar de cima, a conversa muda de tom e amacia. O governo brasileiro tem mesmo de atender os interesses nacionais do Brasil. E estes ficam do lado de uma solução negociada com o governo boliviano, dentro das novas regras estabelecidas soberanamente e de direito pelo novo governo de uma nação que acaba de ajustar contas com sua própria história e de reabrir seu senso de futuro, coisa que tinha perdido. É do interesse nacional do Brasil uma Bolívia soberana e atenta aos interesses de seu povo, que pare de nos remeter imigrantes ilegais para ser mão de obra barata e super-explorada em São Paulo e outras cidades brasileiras. E esta frase nada tem a ver com qualquer sentimento idiota de que “essa gente” vem ocupar o “nosso” espaço, tirar “nossos” empregos, “poluir” nosso meio ambiente com sua suposta “inferioridade”. Tem a ver sim com a luta contra a exploração desabrida do homem pelo homem, com a luta pela igualdade, pela soberania e auto-determinação dos povos.
É do interesse nacional que a Petrobrás permaneça na Bolívia, garantindo, dentro das novas regras e numa negociação de partes soberanas, o abastecimento de gás indispensável ao Brasil e também indispensável à Bolívia, pois este país depende dessa compra pelo seu vizinho e maior comprador.
É do interesse nacional atrair uma Bolívia reerguida para um eixo político e econômico integrador e que hora põe em pauta o gasoduto sul-americano. Isso fortalece a região, atrai o Chile e demais países andinos, pode fortalecer alternativas para o Paraguai e pode ajudar a conter os ímpetos do governo uruguaio de abandonar o Mercosul e partir para uma reintegração subordinada a tratados de “livre” comércio com os Estados Unidos. A atitude do governo boliviano desloca o eixo da história, empurrando-o mais para a esquerda, ele que ficara sempre se inclinando para a direita desde a queda do muro de Berlim e do socialismo europeu até essa presença de governos mais populares (sempre acusados de populistas) na América Latina.
Mas nenhum desses governos teve a ousadia agora demonstrada por Morales.
Se conseguirem uma negociação adequada com o governo boliviano, o governo brasileiro e a Petrobrás entrarão para a história – uma história de que fez e faz parte a luta pela fundação e manutenção da própria Petrobrás como patrimônio coletivo brasileiro.
Flávio Aguiar

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