pensante

René Queiroz

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domingo, março 28, 2010

Quase todos perdidos de armas nas mãos


Muito ainda se falará dessa foto de Clayton de Souza, da Agência Estado, por tudo que ela significa e dignifica, apesar do imenso paradoxo que encerra.
A insolvência moral da política paulista gerou esse instantâneo estupendo, repleto de um simbolismo extremamente caro à natureza humana, cheio de amor e dor.
Este POLICIAL MILITAR BARBADO A PAISANA INFILTRADO ENTRE OS MANIFESTANTES que carrega a PM ferida é um quadro da arte absurda em que se transformou um governo sustentado artificialmente pela mídia e por coronéis do capital.
É um mural multifacetado de significados, tudo resumido numa imagem inesquecível eternizada por um fotojornalista num momento solitário de glória.
Ao desprezar o movimento grevista dos professores, ao debochar dos movimentos sociais e autorizar sua polícia a descer o cacete no corpo docente, José Serra conseguiu produzir, ao mesmo tempo, uma obra prima fotográfica, uma elegia à solidariedade humana e uma peça de campanha para Dilma Rousseff.

Inesquecível, Serra, inesquecível.

terça-feira, março 23, 2010

Manuela


O seu olhar lá fora,
O seu olhar no céu,
O seu olhar demora,
O seu olhar no meu,
O seu olhar, seu olhar melhora,
melhora o meu.
Onde a brasa mora e devora o breu
Como a chuva molha o que se escondeu.
O seu olhar, seu olhar melhora, melhora o meu.
O seu olhar agora,
o seu olhar nasceu,
o seu olhar me olha, o seu olhar é seu.
O seu olhar, seu olhar melhora, melhora o meu.

quinta-feira, março 11, 2010

O que a oposição quer

A definição do candidato e do seu vice não é o maior dos problemas que enfrenta a oposição no Brasil. Este problema aumenta de dimensão porque a oposição não definiu que plataforma pretende propor. Este elemento de fraqueza responde, em parte, pela queda reiterada do apoio a Serra nas pesquisas e pela subida de Dilma.
A oposição frenética que a caracterizou na crise que logrou gerar no governo de 2005 terminou retornando como um bumerangue contra ela, porque acreditou que aquela era a via para derrotar o governo. A linha era “fazer sangrar o governo, até derrubá-lo”. A discussão então era se tentá-lo via impeachment ou pelas eleições presidenciais de 2006.
A realidade concreta recolocou o problema em outros termos: as políticas sociais do governo garantiram sua legitimidade e deslocaram a oposição que, desnorteada, se dividiu entre seguir adiante com a linha de denuncismo e outra que, assimilando o prestígio do governo, afirma que manterá as políticas econômica e social do governo – alegando que teriam sido formuladas pelo governo FHC. No primeiro caso, se deram conta que não significa ganhar apoio popular – salvo de alguns setores da classe média, que já estão aderidos à oposição, incluídos nos 5% que rejeitam o governo -, no segundo, que representa aceitar elementos essenciais do governo atual, tendo dificuldade para diferenciar-se da candidata que representa centralmente a continuidade do governo atual.
O que têm em comum os tucanos, o Dem, o PPS, as empresas privadas da mídia que fazem oposição cerrada ao governo, é o objetivo de tirar o PT do governo. FHC advertia a Aécio – tentando convencê-lo a jogar-se nessa difícil empreitada – de que correm o risco de ficar fora do governo por 16 anos, caso ganhe Dilma. Há a consciência de que será toda uma geração de políticos agora opositores que desapareciam da cena política – entre eles Serra, FHC, Tasso Jereissati.
O dilema não é fácil. A carta de assumir um projeto neoliberal duro e puro – como fez Alckmin no primeiro turno das eleições de 2006 – é ainda menos popular, com a crise econômica internacional, que ressaltou os riscos desse modelo e reiterou a necessidade de regulação dos mercados e de atuações anticíclicas por parte do Estado. Incorporar os programas do governo Lula é disputar com Dilma numa seara favorável a ela. Como já se disse, a infelicidade de Serra é que, quando o país queria mudar, pelo fracasso do governo FHC, apesar de tentar distanciar-se do governo a que pertenceu o tempo todo, ele representava a continuidade. Agora, que a opinião amplamente majoritária do país quer continuidade, ele teria que representar a mudança. Daí o jogo de palavras de tentar ser “pós-Lula” e não anti-Lula. Mas para que exista um pós, deveria estar esgotado o projeto encarnado pelo governo Lula que, ao que tudo indica, está longe dessa situação.
Tendo nas mãos esse problema, Serra vacila em assumir sua candidatura, a oposição não explicita seu programa, revelando o poder hegemônico conquistado pelo projeto do governo. A capacidade de veto da oposição se esgotou, sem ter conseguido construir um projeto alternativo.
Emir Sader

quarta-feira, março 03, 2010

Proposta de Tasso não é séria

O garoto volta da escola com uma nota baixa e o pai, ao ver o boletim, aplica-lhe um tapa na cara:
- Isso vai nos custar duas semanas de fome, seu fio-duma-peste.
O professor, ao corrigir provas dos alunos, terá a responsabilidade de fazer essa ou aquela família passar mais fome que a outra. Não, a proposta de Tasso, definitivamente, não é séria. Não há sentido em vincular o bolsa família ao desempenho dos alunos. Até porque as escolas brasileiras, sobretudo das regiões pobres onde há ampla cobertura do bolsa família, não possuem sistemas de avaliação confiáveis. Enquanto voava em seu jatinho, Tasso, desesperado para ganhar visibilidade fácil, imaginou o estratagema mais eleitoreira possível: propor o aumento do bolsa família. Para não ser acusado de populista, no entanto, teve essa idéia estapafúrdia, tipica de um homem distante da vida simplória das pessoas comuns, de atrelar o aumento do benefício ao desempenho do aluno. Falta pão para o povo? Ora, que comam brioches!
A senadora Ideli Salvati foi a única com bom senso para detectar o absurdo da proposta. A criança sofrerá pressão emocional. Não sei se Ideli percebeu que o professor também sofrerá pressão. Nunca mais corrigirá provas com a isenção necessária. Cada questão corrigida numa prova corresponderá a um valor pecuniário do qual ele privará o aluno, o qual por sua vez irá odiar o mestre, insensível à sua lamentável situação familiar. Muitos professores, compassivos, irão dar somente dez para todos os alunos, para ajudar suas famílias a receberem um pouco mais de dinheiro.
Enfim, serão criadas uma série de distorções, de vícios, de pressões, que apenas contribuirão para denegrir o bolsa família. Além disso, põe o programa em evidência, o que não é saudável. Apesar do tamanho, um programa social deste tipo deve oferecer discrição às famílias que o recebem, pois sempre é uma prova de pobreza extrema. Por isso o cartão é tão bom. Uma vez eu viajei ao nordeste, nos tempos fernandistas, e vi, diante do Banco do Brasil (ou Caixa), uma enorme fila formada na praça de uma cidadezinha do interior. Perguntei a alguém e fui informado que se tratava da distribuição do bolsa escola, o programa social que os tucanos alegam ser o pioneiro do Bolsa Família. Era uma vergonha. Sob um sol escaldante, as donas de casa eram obrigadas a esperar horas a fio para recolher um montante não superior a 15 reais. A humilhação era chocante, porque as senhoras ficavam expostas a todo mundo que passava, que não podia deixar de sentir pensa de quem realizava um sacrifício tão imenso para receber uma quantia tão ínfima. Os tucanos são alienados. Não tem experiência nem imaginação para se colocarem no lugar das pessoas pobres e, portanto, continuamente as prejudicam. Privatizam a telefonia mas não pensam em impor regras impeçam as companhias de cobrar preços abusivos. Privatizam estradas mas lavam as mãos quanto ao preço dos pedágios. Um projeto de lei, assim como a própria lei, possui um espírito. O Bolsa Família deu certo e se tornou um dos programas sociais mais bem sucedidos no mundo porque tem um espírito nobre, simples e objetivo. Visa combater a fome e a miséria extrema, e ao fazê-lo, ajuda a ativar economias antes paralisadas. Qual o espírito da idéia de Tasso? Melhorar a vida das miseráveis populações nordestinas? Melhorar a educação? Não, o cinismo é tanto que os tucanos mesmos confessam que se trata de uma manobra para vincular o nome do partido ao Bolsa Família.
Miguel do Rosário

segunda-feira, março 01, 2010

DEM: O Fim da Ditadura

Como se sabe, o Democratas se originou no bipartidismo imposto pela ditadura, quando Castelo Branco extinguiu os partidos pré-64 e enfiou todos na Arena e no MDB. Na reforma partidária de 1978, o MDB transformou-se em PMDB e a Arena em PFL. Sucessivas operações plásticas o fizeram chegar à atual denominação, que nem sequer guarda o nome de "partido". A diferença entre o sucesso da transformação, no caso do MDB, e o fiasco da Arena é que o segundo não passava de um fantoche da ditadura, enquanto o MDB respondia aos anseios e à vontade política da maior parte da cidadania para sair da "camisa de força" ditatorial. Já em 1980, o PMDB transformado abria a porta para que sua ala esquerda criasse o PT e sua ala social-democrata evoluísse para o PSDB. Partidos menores também puderam ajustar-se ao novo sistema político-partidário. Todos os partidos fazem parte do novo ciclo de "organizações paraestatais", uma transformação que Gramsci não previu, pois as formas do capitalismo contemporâneo fazem do Estado não apenas o garantidor das condições gerais da produção, mas sua vértebra insubstituível. O barbudo de Tiers também deixou passar a oportunidade teórica de introduzir na sua equação da mercadoria a passagem necessária pelos fundos públicos, mas concedamos que o fenômeno estava apenas em seus começos. O velho PSD mineiro já sabia que "fora do Estado não há salvação". Essa sentença do anedotário político das raposas mineiras é mais do que certeira nas condições do capitalismo contemporâneo. Onde é que o Democratas não entendeu o recado? Em primeiro lugar, por refugiar-se nos chamados "grotões" que tanto o desenvolvimento capitalista quanto as reformas do Estado e finalmente o assistencialismo do Bolsa-Família liquidaram. Aí o Democratas acreditou que, mudando o nome e dirigindo-se às classes médias urbanas, voltaria a ser protagonista principal e não apenas coadjuvante (um Oscar para ele!). Acreditou que as classes médias urbanas são liberais, não gostam do Estado, e pagam tudo pela liberdade. Não entendeu nada de Brasil, e não leu, certamente, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Jr. e Florestan Fernandes. Ficou em Casa Grande & Senzala. Daí para resvalar na vala comum da corrupção não há uma distância muito grande, sobretudo em Brasília, cidade campeã e emblema do patrimonialismo. Quanto a Kassab, sobreviveu graças à estratégia política do atual governador de São Paulo, que lhe transmitiu o cargo de prefeito , cujos rendimentos ainda lhe deram fôlego para a reeleição. Mas por aí termina. Entendamo-nos: não é que inexista corrupção e patrimonialismo nos outros partidos políticos, principalmente nos dois principais. Mas eles conseguem administrar interesses bem definidos, o que não foi o caso do Democratas. Mas estão também no modelo "partidos paraestatais": a irrelevância do PSDB em certas regiões do País o afirma: aliás os tucanos não são propriamente um partido, mas como no Vaticano, um colégio de cardeais. Desde o fim da República Velha não há lugar para o liberalismo no Brasil, nem nas periferias capitalistas. O último liberal brasileiro, Rui Barbosa, lutou várias vezes para chegar à Presidência, fracassando em todas elas; é certo que coronelismo, enxada e voto? - a obra maestra de Victor Nunes Leal ? não consentia que um liberal estivesse no topo do Estado. Depois, o Brasil entrou definitivamente - com Vargas, um caudilho gaúcho - na senda da industrialização sustentada no Estado, e então as chances liberais sumiram pelo ralo da indústria e da urbanização acelerada. Os neoliberais tomaram emprestado do avô sua primitiva designação, mas aí a fraude já era evidente, pois mercado nas economias periféricas e no capitalismo contemporâneo só com uma dose cavalar de Estado - que me permita minha querida Maria da Conceição Tavares usar assim de graça seu bordão, e Obama por acréscimo. O Democratas chegou tarde. É uma pena, pois teriam sido um elemento civilizador no começo do século 20. Já no século 21, é apenas um anacronismo. Não quer isso dizer que desaparecerá, pois a diversidade regional, política, social e econômica do Brasil permite várias formações e agrupamentos de interesses. Mas está condenado a ser satélite - e não é do Banco do Brasil que estamos falando - enquanto o ciclo dos partidos paraestatais não se esgota. É bom para a República que a lição que o Democratas não aprendeu esteja sendo dada em Brasília, antiga capital da esperança. Quem sabe ela volta?
Chico Oliveira 01/03/2010 às 20:59
Professor emérito da FFLCH-USP, autor de Crítica à Razão Dualista: o Ornitorrinco

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