pensante

René Queiroz

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quarta-feira, novembro 11, 2009

Zé Celso mata a pau e acaba com a bagunça...

No mesmo dia em que Caetano fazia sua entrevista de capa, muito bela como sempre,
no Caderno 2 do Estadão, o Ministro Ecologista Juca Ferreira publicava
uma matéria na Folha na seção Debates.
Um texto extraordinariamente bem escrito em torno da cultura,
como estratégia, iniciada no 1º Governo de Lula ao nomear corajosa e muito sabiamente Gilberto Gil como Ministro da Cultura e hoje consolidada na gestão atual do Ministro Juca.
Hoje temos pela primeira vez na nossa história um corpo concreto de potencialização da cultura brazyleira: o Ministério da Cultura, e isso seu atual Ministro soube muito bem fazer, um CQD em seu texto.

Por outro lado, meu adorado Poeta Caetano, como sempre, me surpreendeu na sua interpretação de Lula como analfabeto, de fala cafajeste, abrindo seu voto para Marina Silva.Nós temos muitas vezes interpretações até gêmeas, mas acho caetanamente bonito nestes tempos de invenção da democracia brazyleira, que surjam perspectivas opostas, mesmo dentro deste movimento que acredito que pulsa mais forte que nunca no mundo todo, a Tropicália.Percebi isso ao prefaciar a tradução em português crioulo = brazyleiro do melhor livro, na minha perspectiva, claro, escrito sobre a Tropicália: Brutality Garden, Jardim Brutalidade, de Chris Dunn, professor de literatura Brazyleira, na Tulane University de New Orleans.Acho, diferentemente de Caetano, que temos em Lula o primeiro presidente antropófago brazyleiro, aliás Lula é nascido em Caetés, nas regiões onde foi devorado por índios analfabetos o Bispo Sardinha que, segundo o poeta maior da Tropicália, Oswald de Andrade, é a gênese da história do Brazil. Não é o quadro de Pedro Américo com a 1ª Missa a imagem fundadora de nossa nação, mas a da devoração que ninguém ainda conseguiu pintar.Lula começou por surpreender a todos quando, passando por cima das pressões da política cultural da esquerda ressentida, prometeica, nomeou o Antropófago Gilberto Gil para Ministro da Cultura e Celso Amorim, que era macaca de Emilinha Borba, para o Ministério das Relações Exteriores, Marina Silva para o Meio Ambiente e tanta gente que tem conquistado vitórias, avanços para o Brasil, pelo exercício de seu poder-phoder humano, mais que humano.Phoderes que têm de sambar pra driblar a máquina perversa oligárquica, podre, do Estado brasileiro. Um estado oligárquico de fato, dentro de um Estado Republicano ainda não conquistado para a "res pública". Tudo dentro de um futebol democrático admirável de cintura. Lula não pára de carnavalizar, de antropofagiar, pro País não parar de sambar, usando as próprias oligarquias.Lula tem phala e sabedoria carnavalesca nas artérias, tem dado entrevistas maravilhosas, onde inverte, carnavaliza totalmente o senso comum do rebanho. Por exemplo, quando convoca os jornalistas da Folha de S. Paulo a desobedecer seus editores e ouvir, transmitindo ao vivo a phala do povo. A interpretação da editoria é a do jornal e não a da liberdade do jornalista. Aí , quando liberta o jornalista da submissão ao dono do jornal, é acusado de ser contra a liberdade de expressão. Brilha Maquiavel, quando aceita aliança com Judas, como Dionísios que casa-se com a própria responsável por seu assassinato como Minotauro, Ariadne. É realmente um transformador do Tabu em Totem e de uma eloquência amor-humor tão bela quanto a do próprio Caetano.Essa sabedoria filosófica reflete-se na revolução cultural internacional que Lula criou com Celso Amorim e Gil, para a política internacional. O Brasil inaugurou uma política de solidariedade internacional. Não aceita a lógica da vendetta, da ameaça, da retaliação. Propõe o diálogo com todos os diabos, santos, mortais, tendo certa ojeriza pelos filisteus como ele mesmo diz. Adoro ouvir Lula falar, principalmente em direto com o público como num teatro grego. É um de nossos maiores atores. Mais que alfabetizado na batucada da vida, lula é um intérprete dela: a vida, o que é muito mais importante que o letrismo. Quantos eruditos analfabetos não sabem ler os fenômenos da escrita viva do mundo diante de seus olhos?Eu abro meu voto para a linha que vem de Getúlio, de Brizola, de Lula: Dilma, apesar de achar que está marcando em não enxergar, nisto se parece com Caetano, a importância do Ministério da Cultura no Governo Lula. Nos 5 dedos da mão em que aponta suas metas, precisa saber mais das coisas, e incluir o binômio Cultura & Educação.Quanto a Marina Silva, quando eu soube que se diz criacionista, portanto contra a descriminalização do aborto e da pesquisa com células-tronco, pobre de mim, chumbado por um enfarte grave, sonhando com um coração novo, deixei de sequer imaginar votar nela. Fiz até uma cena na Estrela Brasyleira a Vagar - Cacilda!! para uma personagem, de uma atriz jovem contemporânea que quer encarnar Cacilda Becker hoje, defendendo este programa tétrico.Gosto muito de Dilma, como de Caetano, onde vou além do amar, vou pra Adoração, a Santa adorada dos deuses. Acho a afetividade a categoria política mais importante desta era de mudanças. "Amor Ordem e Progresso." O amor guilhotinado de nossa bandeira virou um lema Carandiru: Ordem e Progresso, só.Apreendi no livro de Chris Dunn que os americanos chamam esta categoria de laços homossociais, sem conotação direta com o homoerotismo, e sim com o amor a coisas comuns a todos, como a sagração da natureza, a liberdade e a paixão pelo amor energia, santíssima eletricidade. Sinto que nessas duas pessoas de que gosto muito, Caetano e Dilma, as fichas da importância cultural estratégica, concreta, da Arte e da Cultura, do governo Lula, ainda não caíram.A própria pessoa de Lula é culta, apesar de não gostar, ainda, de ler. Acho que quando tiver férias da Presidência vai dedicar-se a estudar e apreender mais do que já sabe em muitas línguas. Até hoje ele não pisou no Oficina. Desejo muito ter este maravilhoso ator vendo nossos espetáculos. Lula chega à hierarquia máxima do teatro, a que corresponde ao papa no catolicismo: o palhaço. Tem a extrema sabedoria de saber rir de si mesmo. Lula é um escândalo permanente para a mente moralista do rebanho. Um cultivador da vida, muito sabido, esperto. Não é à toa que Obama o considera o político mais popular do mundo.Caetano vai de Marina, eu vou de Dilma. Sei que como Lula ela também sente a poesia de Caetano, como todos nós, pois vem tocada pelo valor da criação divina dos brazyleiros. Essa "estasia", Amor-Humor, na Arte, que resulta em sabedoria de viver do brasileiro: Vida de Artista. Não há melhor coisa que exista!Lula faz política culta e com arte. Sabe que a cultura de sobrevivência do povo brasileiro não é super, é infra estrutura. Caetano sabe disso, é uma imensa raiz antenada no rizoma da cultura atual brazyleira renascente de novo, dentro de nós todos mestiços brazyleiros. Fico grato a Caetano ter me proporcionado expor assim tudo que eu sinto do que estamos vivendo aqui agora no Brasil, que hoje é um país de poesia de exportação como sonhava Oswald de Andrade, que no Pau Brasil, o livro mais sofisticado, sem igual brazyleiro canta:
"Vício na fala
Pra dizerem milho
dizem mio
Pra melhor, dizem mió
Para telha, dizem teia
Para telhado, dizem teiado
E vão fazendo telhado"

quinta-feira, novembro 05, 2009

A Função do Educador

“Diego não conhecia o mar.”.
pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar.
Viajaram para o Sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia,
depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos.
E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai: - Me ajuda a olhar!"

A este texto primoroso, o escritor uruguaio Eduardo Galeano
de "A função da arte", publicado em seu "O Livro dos Abraços" (1989).
Poderia ser também, ao nosso ver, chamado de "A função do pai" ou "A função do educador".
O pai ou o educador não é aquele que ensina ao filho ou ao aluno como é o mar, mas o que, junto com o filho ou o aluno, leva-o a descobrir e a se apropriar do(s) mar(es) mundo que ele vê com os olhos, sente com o coração, deseja com a alma, constrói com a cabeça e as mãos, e sonha com os seus sonhos.
Por isso, quando um filho ou um aluno diz "me ajuda a olhar!", ele está, não só reconhecendo a sua necessidade de ser ajudado a olhar e ver mais longe, mas,
também homenageando seu pai ou seu educador, reconhecendo nele o seu saber,
sua coerência, sua amizade, sua parceria.
Se um pai ou um educador escuta um "me ajuda a olhar!", seja através da fala, dos olhos, das mãos, do corpo, do sonho, do choro, da dor, da alegria, ele deveria sempre responder com um "me ensina o que você viu!"
Só assim haverá uma verdadeira educação, isto é, uma relação plural e entre iguais, de cumplicidade, conluio, apaixonadamente verdadeira.
Esta é, segundo nosso entendimento e nossa prática, a única possibilidade de se construir uma relação efetiva entre pai-e-filho, entre educador-e-aluno.
Educação é o outro nome que se dá a esta relação que só existe e teima em se realizar no plural. É impossível existir educação no singular.
Poderá haver outra coisa, instrução ou ensino, mas nunca educação.
E, se é alguma coisa plural, a função da família é ser, acima de tudo, assim como a escola também deve (e deveria) ser sempre, o "lócus" privilegiado da prática educativa, onde pai-e filho, assim com professor-e-aluno, sejam, ao mesmo tempo, sujeitos e objetos desta construção.
Uma relação entre pessoas diferentes - adultos e crianças - mas uma "relação entre iguais", respeitosa, solidária, afetuosa e enriquecedora para ambos.
Isto é possível?
Claro que é!
Mas para que esta educação se realize em toda sua plenitude, é necessário que o pai ou o professor tome a iniciativa de levar o filho ou o aluno a "descobrir o mar",
a superar, juntos, as "dunas altas", e as "alturas de areia".
Ao fazer isto, o pai ou o educador estará re-descobrindo o mar através do olhar do filho ou do aluno. Este descobrir/redescobrir o mar juntos, significa reinventá-lo,
reciclá-lo, reapropriá-lo, renascê-lo.
E, acreditamos que todo dia é dia de navegar nos mares da vida e de passar este mundo a limpo para que todos nós - pais e filhos, professores e alunos - sejamos, diuturnamente, educadores e educandos do mistério e da mágica que é o viver.
Por outro lado, o "me ajuda a olhar!" tem significado, a cada dia que passa, o nosso compromisso de não deixar que nossa geração de herdeiros - filhos e alunos – vagueie perdida, abandonada e vitimada por um mundo cada vez menos seu.
Este pedido se pode ser um abraço também tem sido um sinal de alerta,
um aviso, um tapa na cara.
Voltemos a Eduardo Galeano, agora em sua "Celebração das contradições":
“... Somos, enfim, o que fazemos para transformar o que somos. A identidade não é uma peça de museu, quietinha na vitrine, mas a sempre assombrosa síntese das contradições nossas de cada dia. Nessa fé, fugitiva, eu creio. Para mim, é a única fé digna de confiança, porque é parecida com o bicho humano, fodido mas sagrado, e à louca aventura de viver no mundo.
Por isso temos que ser sempre educadores, sejamos pais, sejamos filhos, sejamos professores, sejamos alunos, porque "cada promessa é uma ameaça; cada perda, um encontro.
Dos medos nascem as coragens; e das dúvidas, as certezas.
Os sonhos anunciam outra realidade possível e os delírios, outra razão."
"Me ajuda a olhar!?"
"Me ensina o que você viu!?"

Tião Rocha

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